segunda-feira, 15 de junho de 2015

Por que não ANEL?

Recentemente, em nosso último texto lançado – “Porque não participar da UNE?” – mostramos nosso posicionamento quanto à importância em construir uma entidade nacional de representação dos estudantes como a UNE. Neste iremos responder outra pergunta: Por que não ANEL?

Justamente por sabermos que há diferenças gritantes, bem como semelhanças, entre as duas entidades, vimos a necessidade de nos posicionar especificamente sobre cada uma delas, sendo as duas principais forças nacionais que atuam no movimento estudantil. Bem como no texto anterior, é necessário recorrermos a um pequeno histórico desta entidade para nos posicionar sobre.




A nova entidade é a resposta?

A ANEL (Assembleia Nacional dos Estudantes – Livre) surge, no ano de 2009, como deliberação do Congresso Nacional de Estudantes (CNE). Neste período, o CNE era uma frente que aglutinava diversas forças que romperam com a UNE e buscavam uma articulação nacional de organizações políticas, coletivos, federações de curso, partidos políticos e organizações de base estudantil na iniciativa de buscar uma alternativa à degenerada UNE. Do CNE, uma força política se sobressaiu e tinha por objetivo somente construir uma nova entidade nacional: o PSTU.

Notadamente a perspectiva do PSTU em construir esta entidade é a de ser direção das mobilizações estudantis. Mas, que lutas a ANEL pretende “encabeçar”? Vivenciamos nas últimas duas décadas a burocratização do movimento estudantil encampada pela UNE. Lembremos que a UNE não nasceu burocratizada e não possui esta característica como genética, mas sim, foi um processo histórico pelo qual a mesma passou, e que hoje a coloca como instrumento contra as mobilizações e sem perspectivas de retorno. Inclusive foi através das lutas que esta se rearticulou no ano de 1979 com o processo de desintegração da ditadura militar.

A burocratização do movimento estudantil e da UNE também não adveio somente por uma perspectiva teórica ou somente pela imoralidade de seus dirigentes, também este foi um processo histórico. Tal burocratização não seria possível com um movimento estudantil fortemente organizado pelas bases e em um processo de acirramento das lutas, dentro e fora da universidade.

A precocidade de uma entidade nacional

No último período, as lutas localizadas do movimento estudantil por fora da UNE não permitiram ao ME encontrar fôlego suficiente para uma nova articulação nacional que supere a UNE numa entidade verdadeiramente combativa. Mudar as pessoas ou criar uma nova entidade não resolve um problema estrutural que enfrenta o movimento estudantil.

Neste sentido, buscar uma direção sem movimento, sem mobilização é ser uma “vanguarda autoproclamada”, que não possui vínculos orgânicos nas lutas e não nos parece uma alternativa organizativa a nível nacional.

Como observamos no texto anterior, em nossa concepção:
“Vemos que a entidade, estudantil ou sindical, pode cumprir um importante papel não somente nos momentos de mobilização, mas também para realizar formação política com os estudantes, fomentar a auto-organização dos mesmos e, em um momento de luta, cumprir este papel de articulação das lutas estando submetido a elas.”¹
Deslocadas das lutas, porém, essa formação de militantes não cria saldos reais organizativos nas bases e nas lutas. Vemos que é somente nas mobilizações que a consciência de classe pode aflorar e ser fermento de uma transformação da realidade e não nestas entidades.

Vícios da nova entidade

Diferentemente da UNE, vemos a ANEL nas mobilizações, participando delas. Porém, algo curioso acontece com tal entidade: geralmente –ou quase exclusivamente, ao vermos uma camiseta da ANEL, veremos por dentro dela um militante do PSTU. Vemos uma maneira oportunista de se utilizar de uma entidade que aspira a ser representativa, como a ANEL, para a construção somente de seu partido. Esta simbiose entre a ANEL e o PSTU, no limite, transforma a ANEL em núcleo de juventude do partido, escondendo sua organização por detrás da imagem da entidade.

A própria forma como se dá o congresso denuncia sua estrutura. Nos vídeos soltados pela ANEL, para divulgação do congresso, vemos militantes do PSTU de diversos setores falando para o congresso, enquanto membros de outras organizações, ou sem organização, apareciam sem voz.

Seus espaços são organizados no formato de mesas, ou seja, palestras, nas quais o PSTU define quem irá compor a mesa em última instancia, havendo pouco espaço para debate nas mesmas. Em outros momentos do congresso acontecem os “Painéis temáticos” e “Oficinas temáticas”, cerca de dez delas ao mesmo tempo. Esta estrutura impede um debate realmente democrático e efetivo, que aprofunde os temas e consiga levar adiante uma construção conjunta das lutas e da organização pela base.

Há possibilidade de construção?

Alguns outros coletivos participam também da ANEL, como Juventude às Ruas/MRT, Território Livre/MNN, Juventude do PCB (que também participa da UNE), etc. Porém, sua participação é expressiva nas deliberações do congresso?

O que se sabe é que o PSTU possui total hegemonia nesta entidade e uma deliberação dificilmente será aprovada se não for “permitida” pelo partido. Além disso, ele não leva adiante grande parte das deliberações que não são de sua autoria, por não fazer parte de seu programa, tornando a deliberação vazia de conteúdo e de continuidade.

Visto estes elementos, por que alocar energias em uma entidade nacional que se torna núcleo de formação do PSTU? Para nós, o atual momento de rearticulação das lutas no Brasil mostra uma desilusão com a proposta de transformações pela via governamental, oferecida pelo PT. Assim, não cabe organizar por cima o rumo das mobilizações e sim, estar no dia a dia das lutas, fomentá-las, massificá-las, buscar a unidade que transborde o nível das categorias específicas e conquistar um saldo organizativo de cada luta.

Se quisermos uma unidade das esquerdas, ela tem que se dar nas ruas e não em acordos por cima, por fora dessas lutas. Com as poucas energias de que dispomos, não cabe nos perdermos em disputas entre direções –autoproclamadas, e sim, na construção do terreno na qual os debates políticos podem ser realmente férteis e com potencial transformador da realidade. 

É preciso enraizar as organizações que construímos no solo fértil das lutas. Árvores sem raízes logo tombarão.

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