domingo, 5 de julho de 2015

A viagem de Dilma Rousseff aos EUA e os novos alinhamentos do capitalismo

Encontro de Dilma com Obama ocorrido na última semana

A viagem da presidenta Dilma Rousseff aos EUA, com toda a carga simbólica do encontro com Obama e Kissinger[1] e com todos os desdobramentos não explicitados, é um episódio revelador. 

Houve um resfriamento das relações Brasil-EUA, cujo argumento foi a espionagem estadunidense ao Brasil denunciada pelo Wikileaks, e que serviu para justificar a intensificação da integração do Brasil na articulação conhecida como BRICS (Brasil-Russia-Índia-China-África do Sul). Esse alinhamento era apresentado como uma iniciativa de independência com relação ao imperialismo norte-americano. Com a atual reaproximação com os EUA demonstra-se que o projeto de substituir o modelo estadunidense por um modelo de desenvolvimento nacional é uma falácia.

O realinhamento está sendo forçado por uma nova onda de concentração do capital, frente ao qual o BRICS é chaveirinho de criança.  A onda da qual falamos visa a concentração do poder de concorrência de empresas norte-americanas e europeias, desarticulando os BRICS. No caso brasileiro, é essa tendência que está levando adiante a “Operação Lava Jato”, que vem paralisando as obras do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), a menina dos olhos dos governos do PT. As obras do PAC serão retomadas porque são necessárias à expansão dos negócios, mas estes responderão a setores externos mais concentrados. E a viagem da presidenta aos EUA se dá nesse marco. 

Na reunião com banqueiros e empresários a presidenta sinalizou a disposição para que o Brasil tenha uma “economia mais aberta e competitiva”. Aponta, assim, para um abertura que foi derrotada em 2005 quando a proposta da ALCA (Área de Livre Comércio das Américas) foi rejeitada. 

Ao mesmo tempo, as deliberações no congresso a propósito da redução da maioridade penal também se articulam com essa tendência. Visam criar um marco legal para aumentar o componente repressivo e diminuir as políticas “sociais”, posição quase que unânime em todo congresso. Mesmo políticos contrários à redução da maioridade penal faziam, em sua maioria, falas que apontam para a necessidade de um ataque maior à juventude negra e pobre via modificação do ECA (Estatuto da criança e do adolescente). O componente repressivo é necessário para esse novo alinhamento. 

Esses movimentos do executivo e do legislativo brasileiros estão fazendo o papel da transição. Após vários anos de polarização entre o PT e o PSDB, quem parece ter capacidade de representar o novo alinhamento econômico na esfera política é o PMDB. A sinalização de Eduardo Cunha, antes de ontem, de que o PMDB deve sair do governo pode ser a que marque o próximo período da luta institucional. 

Vemos hoje que a estratégia da via parlamentar do PT e do PSOL desarticularam os movimentos organizados e, com essa ofensiva conservadora, nos vemos inaptos a confrontar os ataques contra a população trabalhadora. Só a ação organizada dos setores da população que mais os sofre pode fazer o enfrentamento necessário a esses ataques e superar as ilusões institucionais que têm mantido como refém as organizações do ciclo anterior da luta de classes. 

As greves e movimentos de resistência multiplicam-se. Mas ainda não encontram bastiões sólidos que sejam referência unificadora e ajudem a articular e superar o momento “espontâneo”, localizado ou setorial, cuja energia se esvai momentaneamente. Os povos indígenas têm sido os que mais têm crescido em organização, e também os mais brutalmente golpeados. Novas lutas virão, precisamos ser mais e mais organizados.

Dilma se encontrando com Kissinger
----------------------------------------------------------
[1] - Assessor para assuntos de segurança nacional (de 1968 a 1973) do presidente Nixon e secretário de estado (de 1973 a 1977) do mesmo e do seu sucessor, o presidente Ford. Operador da política externa de EUA, tem sido acusado de campanha secreta de bombardeios contra civis em Cambodja a partir de 1969,  assassinatos em Bangladesh, conspiração contra o presidente de Chipre, aprovação do genocídio de Suharto em Timor Leste, sequestro e assassinato de um periodista em Washington, articulador do golpe de Estado contra Salvador Allende em Chile. 

Comente com o Facebook: